Circulou, em tempos, na Marinha
Grande, ao serviço das Matas Nacionais, um típico meio de transporte por
tracção animal. Era a caleche das Matas. Destinava-se ao uso dos funcionários superiores
e suas famílias e deslocava-se principalmente entre o Parque Florestal do Engenho, onde estava a residência desses funcionários, e o Edifício da Administração, na rua D. Dinis, embora se deslocasse também por toda a povoação sempre
que fosse necessário.
Não foi possível saber em concreto a
data de início de circulação deste meio de transporte, mas já o Eng.º Arala Pinto o usou. De facto, em 1938, no seu livro “Pinhal do Rei”, Arala Pinto
mostra-nos uma fotografia da caleche das Matas estacionada junto ao edifício da
administração.
O poeta marinhense José Duarte de
Carvalho (27 de Janeiro de 1877 – 27 de Fevereiro de 1952) deixou-nos, em 1944,
o seu único livro: “Cristais Sem Brilho”. Neste pequeno livro, escrito num
período de guerra, encontramos interessantes poemas onde o autor relata a
vivência dos marinhenses naquela época. São as dificuldades inerentes desse
período e a dificuldade da Marinha Grande em afirmar-se como uma vila em
prosperidade.
Porém, são já relatados alguns
episódios de franca melhoria, como foi o caso da inauguração do novo teatro, do
busto em homenagem a Guilherme Stephens ou do novo mercado da vila. Depois, há também os
poemas que relatam os mais variados e curiosos acontecimentos da vida
marinhense daquela época.
Num desses poemas, o autor designa a
caleche das Matas como “A carripana das Matas” e alega mesmo ao seu
desaparecimento da praça, certamente a praça Stephens.
Ora, consta que muitos marinhenses
não viam com “bons olhos” este meio de transporte na Marinha, que, apesar de engraçado
e bonito, representava a diferença de classes que existia na população daquela
época, pois estava ao serviço de uma elite de privilegiados. Daí, talvez, a
designação de “carripana“, que, em tom de chalaça, lhe atribui.
Por outro lado, o alegado
desaparecimento da “Carripana” deverá ter sido temporário ou restrito à praça,
pois há indicação de que circulou, pelo menos, até à década de sessenta do
passado século.
Nas duas últimas quintilhas, o autor
refere-se ao desaparecimento da caleche das Matas na praça como sendo uma
melhoria em questões de segurança para a população, principalmente em dias de
mercado, pois “foi-se embora a empecilho, a carripana das Matas”.
Veja-se o poema completo:
«
CarripanaJá não se ouve na praça
Do chicote os seus estalos,
Nem o barulho das patas
Desses fogosos cavalos,
Da carripana das Matas.
E ainda há quem lamente,
Talvez por simples chalaça
Ou por mera brincadeira,
A falta que faz na praça
Os cavalos e a liteira.
Era bonito, confesso,
Dava mais vida ao mercado
A tipóia a deslisar
E o cocheiro empertigado:
Arreda… deixem passar…
Mas por fim tudo acabou,
E na praça, finalmente,
Já se anda descuidado,
Sem esse risco iminente
De morrer atropelado.
Parabéns, gentis freguesas
Do grão-de-bico e do milho,
Do feijão e das batatas,
Foi-se embora o empecilho,
A carripana das Matas.»
A caleche das Matas
junto ao Edifício da Administração – Anos 30 do século XX
(In: Pinto, António
Arala, O Pinhal do Rei. Subsídios, Volume I, 1938)
A caleche das Matas
junto ao edifício das cavalariças no Parque do Engenho
(In: Roldão, Gabriel,
Elucidário do Pinhal do Rei, 2017)
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